
Muito se fala em “dar à luz” a um filho é um processo complexo, que ultrapassa a condição biológica feminina.
Data: 06/05/2020
Autor: Martina Catini Trombeta
Muito se fala em “dar à luz” a um filho, mas poucas vezes refletimos sobre o significado e as profundezas da expressão que está relaciona a um processo.
Um processo que se inicia com a transformação do ser humano que vai receber um outro ser vivo dentro de si.
Vale a ressalva para o “dentro de si”, que faz sentido ser tratado em um conceito amplo, que mais pra frente, neste texto, darei a devida atenção.
Voltemos. Quando se fala em mãe, é um raciocínio quase que automático pensar na mulher que engravida, passa por alterações de hormônio em um processo gestacional que resultará no nascimento de um bebê.
Ter um bebê é a criação de novas conexões consigo e com o mundo. A gravidez é mais do que dar à luz a um novo ser humano, é também criar uma nova família. Um bebê é o catalisador, que abrirá novas possibilidades íntimas de autoconhecimento, relações interpessoais, familiares e profissionais.
Não há dúvidas que a ligação mais forte de um ser vivo é com a mãe e dela com seu filho.
À medida que a gravidez avança, a mulher cria uma história sobre seu filho, se torna investida emocionalmente nessa história. Essas experiências mentais são tomadas de medos, fantasias e expectativas.
As fantasias de gravidez e maternidade de uma mulher são construídas por suas observações pessoais e experiências dela com a sua mãe, bem como da observação e convivência com outras pessoas que fizeram parte de seu processo de criação e construção de valores.
A construção leva em conta percepções emocionais e de interpretação subjetiva de fatos, além de sedimentar valores e crenças enraizados na sociedade, na cultura e nos ambientes de convivência.
Por isso há toda uma magia, um encanto e muitos mistérios na maternidade, que é tomada por alterações hormonais e psíquicas muito poderosas, que dão força a conhecida expressão: “O dia que você for mãe, você vai me entender”, ou então “você ainda tem mãe, não sabe o que é perder”, ou ainda, “quem dera eu ainda tivesse a minha mãe”.
O que é ser mãe?
Dar à luz uma nova identidade pode ser tão exigente quanto dar à luz um bebê. Essa nova identidade com todas as suas particularidades, pode ser suficientemente poderosa para que a realidade surpreenda ou decepcione aquela mãe, caso o dia a dia não se alinhe com seu projeto de vida ou apresente novos desafios.
Convido-os nesse momento a uma reflexão, sabemos que o ato gestacional exige a condição biológica de mulher, com um sistema reprodutivo saudável e com condições de todas as etapas da gravidez.
Faz sentido mudar o foco da “condição fisiológica mulher” para o conceito de gênero, que nos permite falar em mãe, reconhecendo que toda a estrutura da sociedade, e todas as relações entre homens e mulheres podem ser reavaliadas, e passam por um processo de ressignificação?
Se nos permitirmos partir dessa fundamental reestruturação da sociedade e suas instituições ampliando o que é chamado de “dar à luz”, para abarcar as diversas formas de ser mãe enxergaremos a vida sem os filtros impostos por toda uma sociedade, eventualmente por nossos entes queridos e por tantas outras vivencias que não temos em um primeiro momento a consciência de onde vêm.
Restringir a maternidade na biologia do organismo feminino seria desconsiderar todas as mães e filhos que não são frutos desse processo orgânico por diversas razões. Será que isso seria justo com todos nós?
Aqui falamos de mulheres que não podem ou não puderam engravidar e adotaram, seja por um processo legal, bem como as que são mães afetivas. Dentro ou fora de um relacionamento, seja ele hetero ou homoafetivo.
Falamos igualmente dos homens, do ponto de vista biológico, que são mães por terem assumido esse papel, seja sozinho ou dentro de relacionamentos, sem distinção de gênero.
Abarcamos, também, as famílias monoparentais, por opção ou por condição.
As mães, segundo a presente abordagem materializam a realidade e o poder para cada um e nós, sejamos mães ou filhos, tomemos a consciência da amplitude e o poder da condição de mãe dentro da nossa realidade pessoal e do mundo.
A presente visão nos permite reafirmar o que é ser mãe, com um olhar dos direitos humanos e que a igualdade de gênero é uma questão de interesse universal que deve beneficiar a todos.
Quando o mundo passa a enxergar sem restrições de padrões sociais impostos, e passa a compreender as suas emoções com empatia aos outros seres humanos, a construção das relações é muito mais saudável e verdadeira.
Muitas mães têm receio de falar abertamente sobre suas experiências desafiadoras, ou até mesmo não as compreendem. Esse tipo de isolamento emocional é uma barreira, que pode até desencadear em distúrbios psíquicos.
As profundezas de ser mãe e doar o seu amor mais profundo. O que está marcado nos mistérios da mente humana e do coração. Parabéns mães, sejam vocês mães biológicas, afetivas, de criação, mães adotivas, mães que são homens do ponto de vista genético, mães que são mulheres e optaram por ser homens, mães casadas, solteiras, divorciadas, viúvas…
Mães, do ponto de vista humano, com o olhar do amor, e de todas as alterações que as condições da maternidade provocam em nosso corpo, mente, alma e coração.